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Ronaldinho Gaúcho fez o que quis no Flamengo. Sem alarde, sem discussões públicas, travou guerras frias com quem tentou fazer valer a hierarquia rubro-negra. Nesta quinta-feira, depois de ir à Justiça, o camisa 10
deixou o clube pela porta dos fundos e com um histórico de indisciplinas quase sempre camufladas pelo departamento de futebol. A falta de reação custa caro. O jogador cobra uma dívida de R$ 40.177.714,00 e está livre para negociar com outro clube.
No início, nos primeiros sete meses de 2011, comparecer aos treinamentos não foi problema para R10. Sempre pontual, sempre em campo.
Em junho, porém, o noticiário sobre a presença constante do jogador na noite carioca deixou o clube alerta. A diretoria recorreu ao irmão e empresário dele, Roberto Assis, para controlar os excessos. Pediram a Ronaldinho que trocasse a diversão pública pelas longas festas privadas na mansão dele na Barra da Tijuca. A polêmica coincidiu com a queda de rendimento do meia-atacante e resultados ruins no Brasileirão.
Foram as atitudes de Ronaldinh Gaúcho que serviram para azedar a relação com Vanderlei Luxemburgo. No ano passado, o técnico ainda tentou tolerar os atrasos e o baixo rendimento nas atividades pela manhã. Na atual temporada, no entanto, Luxa não escondia sua insatisfação com o astro e levou a pior no cabo de guerra.
Em entrevista concedida nesta quinta-feira, já como ex-jogador do clube, R10 disse que deixa o Flamengo sem qualquer tipo de problema de relacionamento com o técnico Joel Santana ou com companheiros do grupo. Não foi bem assim.
A relação com o goleiro Felipe, por exemplo, há algum tempo não vinha bem. Sem constrangimento, o atacante chamava o camisa 1 de “mão de pau”.
A falta de compromisso do jogador passou a incomodar até mesmo os atletas mais próximos. O episódio recente mais marcante ocorreu em 16 de maio, às vésperas da estreia do time no Brasileirão.
Ronaldinho Gaúcho chegou ao CT para o treino da manhã em más condições físicas e pediu para não treinar, segundo membros da comissão técnica. Recém-chegado, o diretor de futebol do clube, Zinho, precisou agir de maneira enérgica.
Leia alguns causos :
No ano passado, o técnico ainda relevou os atrasos e o baixo rendimento de Ronaldinho nos treinos matinais e jogos. O jogador chegou fora do horário em setembro, outubro e novembro, mas Vanderlei Luxemburgo e o departamento de futebol evitaram maiores alardes. Internamente, o técnico falava em tom de deboche sobre a frequência do camisa 10 nas noitadas.
- O Ronaldinho vai para a boate de segunda a sábado e no domingo joga uma peladinha.
Na atual temporada, no entanto, Luxa decidiu partir para o combate : irritou-se com a insônia no dia da reapresentação, pediu seu afastamento à presidente Patricia Amorim depois do
episódio da mulher na concentração (a diretoria perdoou o jogador) e, nos bastidores, deixava clara sua insatisfação com Ronaldinho.
O treinadorVanderlei Luxemburgo enviava e-mails para a presidente Patricia Amorim para se queixar do capitão da equipe. Nesse cabo de guerra, Vanderlei levou a pior. Foi demitido.
A torcida do Grêmio se mobilizou como raras vezes. No início da tarde do dia 30 de outubro, torcedores já circulavam aos montes pelo Olímpico. E já apareciam munidos de faixas contra Ronaldinho. Era a volta do camisa 10 a Porto Alegre depois de ter preterido o clube que o revelou para jogar no Flamengo. Foram distribuídas cédulas falsas de 100 reais, com o rosto do jogador impresso. A polícia coibiu parte do material. Mesmo assim, muitos conseguiram driblar os olhos dos homens de farda. Dentro do estádio, exibiram mensagens chamando R10 de pilantra e mercenário – entre outros recados que chegaram a envolver familiares dele. No retorno ao Olímpico, levou 4 a 2 de seu ex-clube e teve de ir para a área externa do estádio numa viatura da polícia.
R10 nem ligou. O clima e o resultado ruim não pareceram incomodá-lo. Tanto que horas depois ele reuniu amigos em seu sítio em Porto Alegre para uma festa de que durou dois dias.
Astro do time, vida noturna agitada e dificuldade para cumprir compromissos profissionais. As três premissas anteriores servem tanto para Adriano quanto para Ronaldinho no Flamengo. Mas internamente, a passagem dos dois teve impacto diferente.
Apesar de ausente em várias atividades, o Imperador sempre teve o grupo como aliado. Já a omissão de R10 irritava alguns companheiros.
- Ele não treina, não resolve e eu vou à sala de entrevistas para falar sobre os problemas do capitão. Isso não existe - disse um jogador.
A frase abaixo, dita por um integrante da comissão técnica, resumiu o pensamento :
- A diferença do camisa 10 atual para o de 2009 é simples de ser explicada. Um (Ronaldinho) tem um bom despertador durante a semana, não falta às atividades, mas dorme durante os jogos. O outro (Adriano) não acordava para treinar, mas resolvia em campo.
Quando ameaçado, Ronaldinho Gaúcho demonstrava poder. No episódio em que foi flagrado com uma mulher na concentração de Londrina, ele pediu a demissão de um cinegrafista que trabalhava para Vanderlei Luxemburgo e editou as imagens do flagra.
- Vento que venta lá, venta cá – disparou, ao saber que fora atendido.
Em conversa reservada com a diretoria deu outro recado :
-
Se esse vídeo vazar eu vou f... vocês.
As imagens estão com o vice jurídico Rafael de Piro.
Nas últimas semanas de Flamengo, Ronaldinho adotou um hábito curioso. Ele chegava ao Ninho do Urubu vestido com o uniforme de treino para evitar perder tempo no vestiário trocando a roupa. Desta forma, podia chegar alguns minutos mais tarde.
Na hora de ir embora, a cena se repetia. Em vez de seguir para o vestiário e tomar banho com seus companheiros, o jogador entrava no carro – sempre no banco do carona – e voltava para casa acompanhado da escolta de seguranças.
O Flamengo tem pelo menos dois “autógrafos” de Ronaldinho por causa de advertências. Além do episódio da mulher na concentração em Londrina, ele também foi advertido por causa dos atrasos nos treinos.
Há diversos relatos de dias em que ele chegou sem condição de participar das atividades.
Recentemente, foi confrontado por Zinho. Primeiro, ao constatar o estado do capitão, o diretor pediu que, em vez de ficar no vestiário, ele fosse a campo correr. No dia seguinte, na frente de todos os jogadores, o jogador foi confrontado com direito a peitada e discurso duro :
- Quando eu cheguei, você me deu um abraço e disse que estava comigo. Do jeito que você chegou hoje (quinta, dia 17) e ontem (quarta, dia 16) você não está nem com você mesmo. Isso é um desrespeito com todos os seus companheiros… Se for para ser assim, eu peço meu boné para a Patrícia e vou embora.
O maior desafeto de Ronaldinho Gaúcho no elenco era o goleiro Felipe. O camisa 10 fazia campanha aberta para Paulo Victor ser o titular.
Durante os treinos no Ninho do Urubu, o camisa 10 debochava em voz alta :
-
Pode chutar que a bola entra ou ele espalma para frente.
Na viagem do time para Guayaquil houve uma cena constrangedora no saguão do aeroporto do Galeão. De tão cansado, Ronaldinho mal conseguia falar na chegada ao aeroporto. Na hora do almoço, todos os jogadores se levantaram para cumprimentar a presidente Patrícia Amorim. Ele ficou sentado na mesa escondido pelos óculos escuros. Patrícia ficou sem graça e também evitou o contato. Os jogadores comentaram que onde encostava, ele dormia. Cochilou até no ônibus que levou do saguão ao avião e só acordou quando chegou ao Equador.
Em episódio anotado pela diretoria, o camisa 10 ofereceu US$ 100 (R$ 202) a um garçom durante uma viagem internacional da Libertadores para levar cerveja no quarto dele. Em outra viagem, liderou movimento para que a comissão técnica liberasse bebida alcoólica no voo de volta do Equador.