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. Este mês
o jornal O Dia completa 60 anos. Em busca de se consolidar como concorrente de peso das organizações Globo no Rio de Janeiro, o grupo comemora seis décadas com novos projetos, como conta matéria da revista IMPRENSA de junho (Ed. 268, pág. 38).
Jornalistas de diferentes gerações, Fernando Molica, Lúcio Natalício e Luarlindo Ernesto acompanharam a evolução do jornal e contam, com exclusividade ao Portal IMPRENSA, histórias de bastidores de O Dia ao longo dos anos. Acompanhe.
LÚCIO NATALÍCIO
IMPRENSA: Há quantos ano o senhor trabalha no Jornal O Dia ?
Lúcio Natalício: Eu trabalho há 34 anos, mas tenho de profissão 38 para 39 anos.
Nesses 34 anos de O Dia ? O jornal teve uma grande mudança...
Foi no final de 1988. Com o Décio Malta, que assumiu a direção, o José de Arimatéia no comando, depois veio o José Luiz de Alcântara. Uma grande cabeça pensante do jornalismo contemporâneo. Foi uma das melhores fases que eu peguei aqui no O Dia. Nós conseguimos fazer um "Jornal do Brasil " pelo preço de um O Dia [risos]. Tivemos a melhor equipe de jornalistas na época do Elcimar, Alcântara, Arimatéia e o Orivaldo Perin. Em 1978 ainda era a máquina de escrever. Tinha revisor. Hoje não tem mais. Tinha secretário gráfico. Hoje é o editor da madrugada. E foi numa dessas matérias que nós estávamos bebendo num bar. Depois do expediente, jogando baralho. Lá na rua Riachuelo e foi o estouro da primeira Segunda Sem Lei. Ligaram para o bar falando da Segunda Sem Lei. Então nós conseguimos. Foi numa noite só. A tentativa de fuga do presídio de Bangu 1, metralharam o Palácio Guanabara, jogaram uma bomba no Rio Sul e mataram um delegado no carro da polícia. Isso aconteceu às 23h30. A redação parou. O Nelson Carlos que era o chefe de reportagem e o Mesquita que era o editor de fotografia, a equipe da madrugada foi pra Bangu e nós fizemos o resto. Nós mudamos o jornal, demos a Segunda Sem Lei inteira, de cabo a rabo, tudo que aconteceu. Os concorrentes, O Globo, por exemplo, saiu com uma matéria de 20 linhas, 30 linhas e a gente deu um banho de cobertura. E como a gente jogava baralho depois do expediente, com uma cervejinha, aí o Sérgio Costa, um dos grandes companheiros que eu convivi aqui, disse: "Está oficializado o carteado no bar. Pra quando tiver alguma 'merda' grande a gente já está na rua".
E como você vê os rumos que o jornal está tomando hoje depois de 60 anos ?
Eu vou falar pela minha experiência não só no O Dia, mas isso está acontecendo em todas redações. Antes em uma redação de um jornal era bem feito com repórteres correndo. Hoje em dia tem isso aqui [aponta para o computador a sua frente]. Abre aqui, já tem uma matéria. Acho que a informática serviu pra auxiliar, mas também desempregou muita gente.
Então hoje
temos um número muito menor de jornalistas na redação.
Muito menor. E é tudo via internet. Na reportagem pública, por exemplo. Se algum grande traficante for preso. A Secretaria manda um release e ainda manda foto, tirando a vaga de um repórter e de um fotógrafo. A função da assessoria de comunicação é avisar, mas eles dão a matéria completa. Para o editor é ótimo. Não precisa mandar ninguém ir lá.
E a qualidade do texto ? Você acha que os textos se aprimoraram ?
Não. A nova safra de jornalista saídos das faculdades mostrou que está aí para mostrar o seu valor. Mas
jornal mesmo se aprende a fazer numa redação. Mas eu estou colocando isso porque hoje os alunos de jornalismo são muito mais cabeça feita do que os outros. Os outros chegavam aqui e achavam que... aqui é uma escadinha, né ? Os professores de comunicação estão dando um show.
O que falta pra um jornalista recém-formado é uma boa pauta, uma boa agenda, tem que ter muito telefone. Eu estou gostando dessa nova geração. Eu já convivi com vários, né ?
E o que você espera daqui pra frente, tanto do jornal quanto do seu trabalho ?
A internet deu um tesourada na mídia impressa. Os jornais tem a Globo.com, G1...então leitor não quer saber de matou ou morreu, do acidente, porque isso tudo ele tem na internet. Ele compra o jornal pra quê ? Ele tem que ter na primeira página o impacto e comprar o jornal pela manchete. A tendência da mídia impressa na área policial e na cidade também é o jornalismo investigativo, que rende grandes matérias, chamadas na primeira página. E aqui nós trabalhamos com uma boa equipe. E eu estou aqui dançando conforme a música.
O pioneirismo é uma característica do jornal O Dia ?
Eu acho que dentro do jornal O Dia, o jornal aposta. Tanto que o Meia-Hora bate recorde de vendagem. O Dia aumentou a vendagem. Isso é muito importante. Dentro do contexto a mídia impressa tem que forçar uma barra por que o leitor vê na internet os crimes, os acidentes, o tempo, as estradas. Acho que caminha para fazer um jornalismo dinâmico, investigativo, que chame a atenção do leitor. Eu esqueci de citar uma pessoa. O Dia teve uma pessoa, na direção da redação, que conseguiu revolucionar a vendagem do O Dia. A Ruth de Aquino. Ela conseguiu a proeza de atingir 1 milhão de jornais vendidos em bancas aos domingos. Foi o maior feito. Ela foi a recordista. Ela gostava da redação. Dentro do dia a dia acontece algo fantástico e aquela matéria passa a ser o assunto principal. Você vê o caso Bin Laden. A manchete era do Flamengo. A notícia da morte chegou e mudou tudo. Aí todo mundo compra o jornal, pra ver os detalhes. E ela apostava também no jornalismo investigativo. Foi a pessoa que bateu o recorde de vendagem nesses 60 anos de O Dia. E hoje O Dia segue a mesma tendência do que ela fazia, do que ela falava naquela época: "Investigue a informação."
LUARLINDO ERNESTO
IMPRENSA: Você já está há quanto tempo no jornal O Dia ?
Luarlindo Ernesto: Essa já é a terceira vez. Eu já estou há 19 anos. Trabalhei duas vezes anteriormente, na época do Chagas Freitas ainda, quando o jornal era sanguinolento. Acumulava O Dia, Última Hora e O Globo. Trabalhava em três locais. Eram 5 horas em cada jornal. Era loucura total.
A transição do O Dia, de um jornal dito sanguinolento, para um jornal que atendia ao mesmo público do Jornal do Brasil, do O Globo. Como foi essa mudança ?
Essa mudança foi um negócio que abalou os outros jornais, os concorrentes. O Dia chegou a vender 500 mil exemplares e às vezes até mais aos domingos. Um jornal regional, que vendia mais do que O Globo, que é uma edição nacional, que vendia mais do que o Jornal do Brasil, que também era uma edição nacional. E foi bom porque tirou da mentalidade das pessoas aquele famoso ditado que "se espremer sai sangue". E
mostrou que uma reforma gráfica e editorial foi muito importante no mercado jornalístico brasileiro, principalmente no do Rio de Janeiro, que vivia em função do O Globo e do Jornal do Brasil. Então O Dia entrou numa brecha que até era impossível de se imaginar. Pra fazer uma idéia, 500 mil exemplares por dia mexeu com o povão também.
O Dia começou a atender as classes A, B e C. Antes só atendia a classe C. O anunciante ia anunciar "rosas" no jornal sanguinolento ? Não. Se possível ia anunciar metralhadora, revólver, granada. Mas O Dia começou a anunciar rosas. Houve uma mudança que abalou os donos do outros jornais, dos grandes jornais. Foi bom até para os profissionais que aqui trabalhavam nessa época, que puderam mostrar o potencial. Não era só "o vizinho que matou o vizinho". Tinha reportagem de peso. Reportagem de comportamento, de tudo que interessava as 3 classes. Não ficava só na classe C.
E pra você como foi fazer essa mudança ?
Não foi complicado pra mim, porque nessa terceira vez que eu voltei para O Dia, eu estava vindo do Jornal do Brasil, onde o texto era mais burilado, era um texto mais leve. Então pra mim foi tranquilo. Eu já estava acostumado com o texto do Jornal do Brasil. Saber atingir o objetivo desprezando o cadáver. "Um repórter policial só pensa em cadáver". Não. Você esquece o cadáver e vai falar em volta do cadáver. Ele não é mais o alvo principal. Essa transição não foi traumática. Eu tirei de letra. Exatamente por estar acostumado com o texto do Jornal do Brasil.
E hoje com a entrada forte da internet no jornalismo e na transmissão da notícia ? Como você vê o papel do O Dia nesse mundo globalizado ?
Há espaço pra todos. Ainda há espaço pra todos.
Se o jornal o jornal impresso vai morrer, vai demorar ainda um pouco. É provável até que morra, mas vai demorar um pouco.
Que rumos o jornal pretende tomar ?
É difícil a gente saber. As pessoas não estão assimilando bem essa mudança. As pessoas estão saindo do jornal por vontade própria. Não há demissões na redação. As pessoas estão saindo porque não estão se adaptando aos novos tempos dessa empresa. Mas nem por isso a gente deixa de vibrar, de correr atrás, de trazer a notícia. Às vezes é notícia pra mim, mas pro patrão não é. Mas eu continuo escrevendo. Se vai sair ou não, não é problema meu. Aqui eu estou como profissional. Lá fora eu posso até reclamar: "Eu escrevi isso e não deram nada." Aí no dia seguinte eu vejo aquela notícia no jornal concorrente que eu escrevi e O Dia não deu. Isso acontece e vai acontecer sempre. Mas muitas pessoas não estão assimilando os novos tempos. Tem essa briga com internet. O leitor de jornal é leitor de jornal. Não resta dúvida. É preciso até cultivar novos leitores. Começar até da escola.
Hoje você acha que ainda existe espaço para uma investigação minuciosa ?
Hoje é muito mais difícil. O espaço é pequeno, o tempo é curto, pouco recursos e aqui é o resultado imediato : apurou, escreveu e manda. Pro on-line e pro jornal escrito. É muito mais ágil, mas você não tem tempo pra fazer uma investigação mais profunda. Tem jornais que tem como fazer isso, tem televisões que fazem isso, mas aqui é difícil, quase impossível. Então a gente faz o dia a dia, o feijão com arroz. E vamos sobrevivendo.
FERNANDO MOLICA
IMPRENSA: Há quantos anos você está no Jornal O Dia ?
Fernando Molica: Completo 3 anos em junho. Até que já é um tempo.
Você que é um jornalista que trata de política. Como é tratar esse assunto no jornal O Dia que é um jornal voltado para a editoria de Cidade ?
Eu tenho uma coluna. E é uma coluna bem antiga, tem tradição no jornal. Eu procurei não abandonar a política local. Procurei encarar a política de uma forma mais ampla. Quando tratamos da eleição, por exemplo, tomou toda a coluna. E sempre tentando aproximar do leitor. Nos últimos 15 dias o assunto tem sido a reforma do Maracanã. Os temas de cidade, de administração pública dominam, sempre com um viés político. Eu procurei abrir o leque. Acrescentando temas que mexem mais diretamente com a vida da população. Você está tratando de algo que tem a ver com quem está lendo. Você trata de transporte público, saúde. Até porque nós temos um tipo de leitor que precisa muito do serviço público: escola pública, transporte público. Então nós temos que procurar atender o interesse.
Que tipo de mudança nesses últimos três anos você acha que foi mais significativa dentro do jornal ?
O Dia passa por um desafio, uma perspectiva que todos os jornais impressos do mundo passam. A internet apresentou esse caminho que você é obrigado a passar.
O site do O Dia é um site bem frequentado, com um número de acessos bem alto. E eu procuro interagir com isso. Na coluna eu não tenho uma versão eletrônica. A coluna sai no jornal impresso e ela tem diariamente algumas notas que ficam disponíveis na versão on-line. O que eu procuro fazer é quando tem uma notícia relevante demais, que seja importante ser divulgada logo ou algo que eu vou ser "furado", que daqui a 2h, 3h, aí a gente faz uma edição extra do informe. E jogo no on-line. Mas isso especificamente em relação à coluna. O jornal trabalha essa lógica de interação. Não tem jeito.