Eduardo Bolsonaro deveria recuar, mas não pode mais
Há quatro meses, seria improvável que a esquerda conseguisse colocar tantas pessoas nas ruas quanto no último final de semana. O governo, afinal, estava no corner político, colecionando derrotas no Congresso Nacional, e Lula parecia engolfado por uma espiral negativa de impopularidade crescente. Mas as coisas mudaram dramaticamente desde as imposições tarifárias de Donald Trump. A tentativa de o presidente americano de intervir em favor de Jair Bolsonaro vem produzindo o efeito inverso ao pretendido e propalado por Eduardo Bolsonaro, entusiasta da tese da “terra arrasada”.
O que se viu foi a materialização do crescimento do presidente nas pesquisas de aprovação e intenção de voto nas eleições de 2026. As imagens produzidas em várias capitais do país foram contundentes, principalmente para os que acham que a vitória de Lula em 2022 é resultado de uma conspiração do TSE. Na última pesquisa Atlas/Bloomberg, o petista vence todos os seus adversários oposicionistas nas simulações de segundo turno, incluindo o próprio Jair Bolsonaro.
Com os fracassos em série, seria aconselhável que Eduardo Bolsonaro recuasse. Mas ele já não pode mais. Não deixou nenhuma porta aberta para escape, nenhuma margem para negociação, ninguém influente com quem tenha possibilidade de diálogo fora de sua bolha
O lulopetismo se anabolizou politicamente, instado por uma circunstância política que caiu no seu colo pelas mãos do bolsonarismo. Como já havia escrito em julho, o all-in geopolítico de Eduardo Bolsonaro ajudou Lula a recuperar o fôlego perdido. Ele ganhou um antagonista internacional, incorporou um discurso político coeso de defesa do interesse nacional, passou a articular os interesses econômicos dos setores produtivos afetados e recuperou os elos comunicantes rompidos com Hugo Motta e Davi Alcolumbre. Enquanto, isso, dos Estados Unidos, Eduardo Bolsonaro, o filho do ex-presidente nos convidava a, de bom grado, sacrificar a economia e os empregos em nome de sua causa.
Até aqui, nem as tarifas, tampouco a Lei Magnitsky, tiveram o condão de mudar o curso dos acontecimentos. Bolsonaro foi parar em prisão domiciliar para, logo depois, também ser condenado pelo STF, e investigações adicionais por coação no curso do processo foram instauradas contra ele e Eduardo Bolsonaro.
Adicionalmente, a pauta da anistia acabou sendo instrumentalizada pelo Centrão, convertendo-se não mais do que num projeto de mudança de penas, com direito a Michel Temer rebatizando-a de PL da Dosimetria. E talvez nem essa prospere, depois das novas sanções institucionais impostas pelos Estados Unidos a esposa de Alexandre de Moraes e autoridades do governo brasileiro. Ao invés de intimidarem as forças políticas, estas apenas reforçaram seu espírito corporativo e proteção mútua.
Com os fracassos em série, seria aconselhável que Eduardo Bolsonaro recuasse. Mas ele já não pode mais. Não deixou nenhuma porta aberta para escape, nenhuma margem para negociação, ninguém influente com quem tenha possibilidade de diálogo fora de sua bolha. Ao contrário. Ameaçou lideranças e atacou aliados de primeira hora, inclusive com mais ênfase do que aquela que costuma reservar ao PT. Além de não reverter a prisão do pai, ainda condenou o próprio mandato. Na última quarta, Donald Trump anunciou que deu um abraço em Lula. Pode ter sido também o beijo de morte que deu nas ambições de Eduardo Bolsonaro.
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