[RESENHA EXCLUSIVA]
Como minha primeira compra na livraria Saraiva, consegui a primeira edição do Barks pela Panini Comics, ou seja,
Coleção Carl Barks Definitiva # 16, lançado em outubro de 2019 com o subtítulo "Tio Patinhas - A coroa perdida de Gengis Khan". As histórias desta edição foram traduzidas pelo grande Marcelo Alencar e remetem a características das publicações originais americanas, como uma exclamação no final de alguns títulos. Das 27 HQs e tiras deste volume, eu já conhecia 18. Indexei esta edição no Inducks. Editoralmente falando, a coleção segue completamente o que já havia sido começado pela Abril, sendo este um ponto positivo para a Panini.
Em "A coroa perdida de Gengis Khan", os patos saltam de avião sobre o "telhado do mundo", ou seja, o Tibete, conhecido por ser a região mais alta do mundo. Outra expressão utilizada na história, com a finalidade de demonstrar espanto, é "Grande César!". Uma outra região asiática é citada na história seguinte, "Fabricantes de Terremotos", na qual Patinhas revela ter uma fábrica em Bornéu, uma ilha da Ásia. O pato também chantageia Donald com os juros dos 50 centavos que lhe emprestou em 1950. A história foi criada em 1955, mas essa piada fica mais engraçada conforme os anos vão passando. A trama fala em "platô" e "lajes de germânio", mas ficou no "inconsciente coletivo" de muita gente por causa de outro elemento, os personagens Terries e Fermies. Outra coisa curiosa é que um dos sobrinhos de Donald leva um telefone (com fio) para o ambiente subterrâneo em que os patos estavam descendo.
O comentarista Daniel Yezbick falou do "ceticismo anti-intelectualista de Barks". Interpretei isso apenas como algo da personalidade do próprio Donald, o personagem. Barks, por sua vez, deixou explícito o significado real da origem dos terremotos na última página, através da fala de outro personagem. Ou seja, apesar das piadas feitas, a ideia não era criticar estudos acadêmicos sobre o tema e confrontá-los com outras referências, mas apresentá-los e ao mesmo tempo incentivar que os leitores buscassem explicações práticas, que tivessem curiosidade de observar como as coisas explicadas pelos cientistas funcionam no mundo empírico. Eu também teria trocado a expressão "farsas barksianas" para "ficções barksianas". Na imagem (em inglês) destacada no artigo, o que o Fermie quis dizer com "Shucks, podner, you shore ain't been around"?
Em "Previsões do futuro", Patinhas mostra-se supersticioso. O diálogo inicial da história é "- Donald, você também lê a sorte? / - Não como o senhor, que olha bolhas na xícara e café". O sobrenome Patinhas Mac Patinhas foi mantido na tradução desta HQ. Também vemos uma citação à "Meia de Algodão, na Carolina do Sul" (em referência a uma loja com a placa "Meias de algodão pra qualquer pezão"). Na trama, Patinhas despacha seus sobrinhos numa viagem pelos Estados Unidos para comprar caixas de cereais (que davam como brinde lotes de terra). Os patos compram "dois milhões de caixas em três estados" e ao final do processo todo (viagens inclusas) revelam ter gasto a mesma quantia numérica, dois milhões, agora em patacas. Ou seja, a caixa de cereal custava bem menos que uma pataca.
"Qual o mais rico do mundo?" marca a primeira aparição do Pão-Duro MacMônei. A HQ cita regiões geográficas como Vale do Limpopo e Trípoli. A moeda "shilling" não foi traduzida para "xelim" nesta história. Patinhas avisou que visitaria MacMônei através de um "cabograma". O cabograma é uma mensagem telegráfica transmitida através de cabo submarino. Segundo a Wikipédia, os cabos submarinos são colocados no relevo oceânico, entre estações terrestres, para transmitir sinais de telecomunicações através de trechos de mar. Os primeiros cabos submarinos foram estabelecidos na década de 1850, para o tráfego de telegrafia, justamente o uso feito por Patinhas. Além de deixar registrada a fortuna exata de Patinhas, equiparada à de MacMônei, o comentarista Alberto Becattini ressaltou que o que diferencia os dois milionários é que MacMônei é desonesto. Oras, quem leu a história viu que Patinhas utilizou-se de métodos tão desonestos quanto os de seu rival. Não deveria ser um problema para o analisa reconhecer isto.
Em "O progresso", vemos que Barks concebeu Patinhas como um personagem muito idoso. Ele revela estar com sua Caixa-Forte no mesmo local "há 70 anos". Somando-se a isso a infância do personagem e seus tempos de Klondike, o velho facilmente teria mais de 90 anos de idade. Outra característica vemos nos desenhos de Barks: Patinhas é bem mais baixo do que outras personalidades de Patópolis. Ele fica totalmente em pé em cima da mesa do "responsável pelo planejamento das ruas" e ainda assim fica mais ou menos do mesmo tamanho que o secretário na posição sentado. No roteiro desta história, o poder público não se rende ao poderio econômico de Patinhas, e mantêm-se inflexível em suas decisões. A história não revela quando Patinhas pode voltar a instalar sua Caixa-Forte no Morro Matamotor. O comentarista R. Fiore diz que "no fim, ele acaba recebendo o triplo do valor por seus direitos de proprietário", mas não achei indicação a isto na HQ, que menciona ainda uma plataforma de lançamento de um "foguete postal".
"O elemento mais raro do mundo" é uma das minhas histórias favoritas de Barks. Apesar do "bombastium" ser descrito como "bola avermelhada", na maioria das páginas sua coloração é laranja. A publicação seguiu as paletas de cores mais próximas às publicações originais americanas. Barks brinca com pias como critério de desempate no arremate, mas a casa de leilões expunha um cartaz com a regra "Só aceitamos dinheiro". Uma participação importante da história é o representante da Brutópia, associado a um contexto de Guerra Fria, com a disputa de poder entre americanos e soviéticos. A história também menciona uma tal "crise de 1902". Um dos sobrinhos de Donald sugere emular o "bombastium" com "flavorizantes". Segundo o dicionário associado à pesquisa Google, este termo deve ser evitado, sendo substituído por "saborizante" ou "aromatizante".
A primeira página de "Os índios nanicós" mostra um cartaz com um anúncio traduzido para "Terreno em Itapira". Esta cidade existe mesmo e localiza-se no Estado de São Paulo. A história menciona também "O Pequeno Havita", "desenho animado Disney inspirado no poema A Canção de Hiawatta" (Hiawatha, na análise dos comentaristas desta edição), provável origem também do personagem Havita. Pesquisando no Google, vemos que esta história de Barks fez parte de uma análise do livro "Filosofia na Língua Portuguesa", de Jean Lauand. Uma ilustração que gostei bastante localiza-se na página 171, quando um dos sobrinhos de Donald troca olhares com um pássaro enquanto Patinhas revela suas falsas intenções. Na imagem acima, o que são esses pontos no peito de Patinhas quando ele abre a camisa?
Em dado momento de "A fantástica corrida de barcos", Pirata Metralha e os "Metralhas" precisam de mais velocidade em seu barco, recomendando "mais lenha nas caldeiras". Os bandidos resolvem "queimar dinamite" e "jogar tudo fora para aliviar o barco". Não seria mais conveniente terem colocado para queimar as coisas que atiraram para fora do barco, como roupas e malas? Na tradução da análise de Thad Komorowski sobre essa história, foi utilizado o adjetivo "disneyanos". Logo depois, a seção de artigos segue com uma análise das "Gags de Uma Página" que não passa de uma mera e longa descrição de todas elas.
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![Imagem](https://i.imgur.com/DiDlf4n.jpg?1)