Neste dia 20 de junho de 2021, você certamente verá muitas pessoas, notícias e até mesmo páginas oficiais celebrando os 50 anos de Chaves. Segundo a versão corrente em diversos lugares, o programa criado e estrelado por Roberto Gómez Bolaños teria aparecido pela primeira vez nas telas nesta data, há cinco décadas. No entanto, os indícios históricos coletados por fãs — e relatado até mesmo pelos protagonistas das séries — não sustentam essa versão.
Hoje, em que o Chaves supostamente completaria seus 50 anos, trazemos este conteúdo especial para apresentar todas as provas de porque, afinal, é incorreto dizer que o menino do barril apareceu pela primeira vez no dia 20 de junho de 1971.
Contexto histórico
Para entender essa história, é preciso ter em mente uma diferença entre os "Chaves" existentes. El Chavo del Ocho ou, como conhecemos aqui no Brasil, "Chaves", é um personagem que, inicialmente, apareceu como um quadro no programa Chespirito. Esta atração teve outros nomes como Los supergenios de la mesa cuadrada e Chespirito y la mesa cuadrada, tendo surgido em 1970. A princípio, era um quadro de oito minutos, tornando-se um seriado independente no ano de 1973. Em 1980, "Chaves" volta a ser um quadro fixo do novo programa Chespirito, perdurando até 1992 nas telas.
Nossa história começa mais cedo ainda, em 1969, quando o então roteirista — e não tão significativo ator Roberto Gómez Bolaños foi convidado a integrar a Televisión Independiente de México (TV TIM), fundada em 1965. Já conhecido como "Chespirito", ele começa sua trajetória na emissora com uma sitcom de 13 episódios, intitulada El Ciudadano Gómez, que mostrava as situações de um homem cujo objetivo de vida era ajudar os mais fracos e oprimidos — mas também era incapaz de perceber o quão intrometido e inconveniente ele era.
O programa foi gravado em 1969, mas estreou apenas em 14 de outubro de 1970. Nesse meio-tempo, Roberto ganhava espaço dentro do famoso programa Sábados de la Fortuna, uma atração ao vivo e de várias horas com sorteios. Entre uma promoção e outra, atrações de diferentes tipos — até o brasileiro Wilson Simonal chegou a se apresentar naquele 1970, durante a Copa do Mundo. Além disso, havia também esquetes de humor.
Chespirito dividia-se em dois blocos: Chespirotadas e Los supergenios de la mesa cuadrada. O primeiro era uma combinação de piadas curtas, com o elenco se desdobrando em diferentes papéis, inclusive de crianças. A atriz americana Bárbara Ramson era uma dessas integrantes, tendo saído do quadro ainda em 1969. Numa entrevista de 2012, declarou estar convicta de que, se continuasse, interpretaria a Chiquinha, pois também fazia tipos de meninas no programa — María Antonieta de las Nieves entrou para o elenco em seu lugar.
Já os "Supergenios" eram uma sátira aos programas de mesa redonda. Na "mesa quadrada", ao vivo e com plateia, Chespirito (interpretando o Dr. Chapatin) era acompanhado de Ramón Valdés (o bêbado Tirado Alanís), María Antonieta (a condutora chamada de "La Mococha Pechocha") e Rubén Aguirre (Professor Girafales), respondendo perguntas de cartas fictícias, além de debochar de celebridades mexicanas e fatos recentes. Antes, Ramson fazia o papel de secretária e o cubano Aníbal del Mar foi o primeiro condutor.
O sucesso nos sábados foi tamanho que, em 15 de outubro de 1970, o horário nobre da TIM recebia um humorístico que unia os dois blocos, chamado apenas de Los supergenios de la mesa cuadrada. A atração foi crescendo e aperfeiçoando seu formato, dando espaço a quadros fixos que logo seriam febre entre os mexicanos, como o Chapolin Colorado, que apareceu pela primeira vez em novembro de 1970.
Dirigida por Chespirito e Enrique Segoviano, a atração foi modificada com a saída deste último e a entrada de Alberto del Bosque, em janeiro de 1971, passando a se chamar Chespirito y la mesa cuadrada, contando com 40 minutos de arte. No entanto, aos poucos o quadro da mesa foi perdendo espaço, por ser excessivamente apelativo, além de ir ao ar com piadas sobre fatos que ocorreram semanas antes, sem o mesmo frescor. Ao mesmo tempo, Bosque não concordava com os improvisos de Ramón Valdés e acabou saindo da atração, dando lugar a Eduardo Alatorre, que fez o programa virar somente Chespirito.
O programa "Chespirito" em junho de 1971
A partir de maio de 1971, Chespirito passou a ser exibido sempre às quintas-feiras, às 21h. Já o suposto dia da estreia de "Chaves", 20 de junho de 1971, foi um domingo — quando o programa nunca era exibido. Em algumas ocasiões, passava aos sábados, pelo canal 9 de Guadalajara, mas no canal 8 da Cidade do México estava sempre num único horário. Fôssemos considerar uma reprise aos domingos, então "Chaves" teria de ir ao ar no dia 18.
Aliás, sem o exitoso quadro da mesa quadrada, como era Chespirito? Além de personagens como Chapolin Colorado, Chómpiras e Dr. Chapatin, trazia esquetes sem conexão entre si, com piadas curtas, enquanto incorporava quadros fixos progressivamente, como "Los Chifladitos", a comédia nonsense dos loucos Pancada Bonaparte (Chespirito) e Lucas Pirado (Rubén Aguirre).
Sobre este quadro, especificamente, a revista Tele-Guía, mais confiável publicação sobre a TV da época, trouxe a primeira menção ao quadro dos maluquinhos em sua edição 995. No dia 2 de setembro de 1971, era exibido o programa Chespirito com a seguinte sinopse: El Chapulín Colorado, Chaparrón Bonaparte y Lucas Tañeda, dos loquitos mansos.
A sinopse acima refere-se a Los Chifladitos, como sendo uma grande novidade. Não é difícil imaginar que o quadro não tinha dado as caras antes de agosto. O porquê disso ser tão importante? Veremos a seguir.
Los Chifladitos e a saída de Rubén Aguirre
Sabia que as pessoas continuam dizendo que você e eu estamos loucos?
Com esta frase e ao som de Voodoo Child, de Jimi Hendrix, começava o quadro de Pancada e Lucas. Os dois malucos eram um charme do programa, proporcionando pérolas como a exibida em 17 de fevereiro de 1972, quando o Chapolin Colorado é invocado para proteger Lucas Pirado, ameaçado de morte pelo Pancada por causa de uma dívida.
Até onde se tem registro, sua última exibição foi em 20 de abril de 1972, num esquete com a seguinte sinopse: Chaparrón y Lucas deben de proveer de aire a un hombre que está a punto de desinflarse. O quadro foi interrompido por uma ausência: a de Lucas, ou melhor dizendo, de Rubén Aguirre.
O ator acompanhava Chespirito desde os tempos de El Ciudadano Gómez, mas foi abalado por uma proposta irrecusável: escrever um programa no Telesistema Mexicano, o canal 2, de alcance nacional e gerido pela poderosa família Azcárraga, com direito a um salário maior do que recebia no 8. A saída foi amigável e as portas ficaram abertas caso ele quisesse voltar. Em 19 de maio de 1972, estreava como roteirista do programa de concursos Sube, Pelayo, Sube, comandado por Luis Manuel Pelayo.
Em sua autobiografia, Roberto Gómez Bolaños diz o seguinte sobre aquela situação:
Rubén voltaria algum tempo depois, mas, naquele momento, sua ausência significou a adversidade do momento, pois o personagem que ele representava, Lucas Pirado, era insubstituível por muitos motivos; o principal deles sendo o fato de que o público se acostuma com uma imagem e depois tem muita dificuldade em aceitar outra como substituta. A solução, portanto, não foi substituir o ator, mas substituir o quadro. Ou seja: retirar Pancada Bonaparte e colocar algo diferente em seu lugar.
Mas o que seria esse algo diferente? Passei dois ou três dias (com suas respectivas noites) tentando encontrar a resposta, mas esta não veio. Então, aflito pela escassez do tempo, resolvi sair do cronograma por uma semana, fazendo um esquete dos que eu chamava de "avulsos", porque não tinham continuidade temática temporal. Para isso, usei material que sobrara de outro esquete avulso que eu tinha feito algumas semanas antes. Referia-se a um menino pobre que estava caminhando em um parque público e tinha uma breve discussão com um vendedor de balões. O menino havia sido representado por mim, e o vendedor de balões, por Ramón Valdés.
O resultado foi não apenas aceitável, mas também deixou material sobrando. E, enquanto eu continuava a pensar no esquete definitivo, repeti a receita: usei o material que havia sobrado para escrever algo com uma atmosfera semelhante. Dessa vez, o resultado foi mais do que aceitável, e os comentários positivos não tardaram a chegar. Até que, algumas semanas depois, batizei o personagem com o nome que se tornaria conhecido em várias partes do mundo, rivalizando em popularidade com Chapolin Colorado (e, em mais de um aspecto, inclusive o superando): Chaves.”
Em resumo: após a saída de Rubén, Chespirito cancelou o quadro do Pancada Bonaparte e, em seu lugar, trouxe uma ideia desenvolvida antes, "sem querer querendo": a de um garoto interpretado por um adulto. Em uma entrevista de 2003, Gómez Bolaños menciona um diálogo desse esquete primitivo do Chaves:
— São balões? — pergunta o garoto ao vendedor de balões.
— Não. São cabeças de moleques que andei cortando — ironiza o senhor.
Em 1976, no seriado Chaves, há um diálogo semelhante entre Quico e Seu Madruga:
— São balões? — pergunta Quico.
— Não. São cabeças de moleques com bochechas inchadas — ironiza o Seu Madruga.
Naquele esquete, surgem então os protótipos de Chaves e Seu Madruga. O personagem de Ramón, certamente, era como o ator, como prosseguiu enquanto interpretava o "Don Ramón". Já o Chaves, não seria difícil imaginar Roberto reutilizando o suspensório, camiseta amarela listrada, calça azul, sardas e gorro verde daquele quadro inicial, pelo curto espaço entre sua criação e consolidação. O gorro, aliás, é semelhante a um usado pelo comediante Germán "Tin-Tan" Valdés, irmão de Ramón e uma das inspirações de Roberto, em um de seus filmes.
Embora o Professor Girafales já existisse, ele não participou dos primórdios do Chaves mas, por sua vez, Rubén Aguirre disse ter intepretado o pai do menino. Pode ser, talvez, uma confusão do ator que, em 1970, num esquete curto, fez o genitor de uma menina travessa, de maria-chiquinhas e sardas, apelidada de La Chilindrina.
Como se vê, a criação do Chaves veio ao acaso, pela saída de Rubén Aguirre. Fato reconhecido, inclusive, por Roberto Gómez Fernández, filho de Chespirito e defensor da data de 20 de junho de 1971. Em 2016, no dia do falecimento do intérprete do Professor Girafales, Fernández concedeu uma entrevista na qual disse:
Pouca gente sabe, mas foi por culpa do Rubén Aguirre que o Chaves nasceu, porque eles [Rubén e Chespirito] formavam uma dupla que depois viriam a repetir: a de "Los Chifladitos", Lucas Pirado e Pancada Bonaparte, no início dos anos 70. E oferecem ao Rubén Aguirre um programa de televisão na concorrente, então ele vai ao canal 2 — até então ele estava no canal 8 — e meu pai fica sem o esquete para produzir e o único que o vinha à mente era algo que ele tinha escrito sobre um vendedor de balões e umas crianças que queriam comprar um balão, mas não tinham dinheiro, e o vendedor odiava crianças, que era o Seu Madruga. E daí começa a surgir aquele esquema do Chaves, que digamos que foi criado graças ao Rubén ter saído por um tempo à concorrente. Já depois de alguns anos ele voltou, mas ainda foi, assim, parte da gratidão.
Pode-se até questionar que o esquete dos balões teria sido exibido em 1971. Mas a possibilidade é bastante remota, como veremos na sequência.
A estreia de El Chavo del Ocho
Ainda que houvesse um menino pobre querendo um balão, ele não era oficialmente El Chavo del Ocho, mas um garoto ("chavo") como outro qualquer. O personagem como conhecemos ganharia a companhia daquele senhor que vendia balões, "Don Ramón", e de uma menina sardenta e usando óculos, "La Chilindrina".
A primeira menção aos três na Tele-Guía foi na edição 1.031, que trazia a seguinte sinopse para o dia 11 de maio de 1972: El Chavo del Ocho se ve envuelto en problemas con el papá de Chilindrina. O quadro foi exibido três semanas após o último "Pancada" e uma antes da estreia de Sube, Pelayo, Sube.
Ainda em maio, surge o cenário da vila. Dos esquetes que temos acesso, o mais antigo é Remédio duro de engolir, cuja data de estreia segue desconhecida. Seu Madruga e Chiquinha moravam na casa que passaria a ser de Dona Florinda e Quico. Ele vestia boina preta e camiseta azul. O Chaves não chorava com "pipipi", mas com um falsete. E o barril sequer existia. O ambiente foi usado também em Los Polivoces, humorístico de Enrique Cuenca e Eduardo Manzano que dividia atores, figurinos e cenários com Chespirito. Num esquete de 1972, os personagens Don Laureano (Cuenca) e Doña Paz (Manzano) compram um carro estacionado no pátio da vila.
Logo depois, outros personagens seriam incorporados ao quadro do Chaves, como o Quico (Carlos Villagrán), cuja aparição mais antiga disponível foi em Quem semeia moeda..., ainda sem a Dona Florinda. Em seguida, entra a Dona Clotilde que, embora chamada de "Bruxa do 71", sua casa ainda não tinha o número 71 aparente aos olhos do espectador.
Há quem diga que o "Bruxa do 71" é uma referência à estreia naquele 1971. Fato é que o termo pode mesmo ser um trocadilho com títulos como "A bela do 70" ou "A musa do 67", que se referiam às mulheres mais belas de cada ano. No entanto, a edição 1.033 da Tele-Guía traz uma sinopse para 29 de maio de 1972 que dá a entender que a estreia da personagem foi naquele dia: El Chavo del Ocho cree que existe una bruja en la vecindad y pone en movimiento a todos.
Florinda Meza ingressaria ao elenco após Chespirito vê-la no programa La Media Naranja. Sua estreia, possivelmente, foi anterior ao dia 3 de julho de 1972, quando é transmitido o quadro Quem canta, seus males espanca, no qual os personagens já se conhecem bem — e Dona Florinda promete nunca mais bater no Seu Madruga. Uma hipótese seria o dia 19 de junho, quando a Tele-Guía 1.036 traz a sinopse El Chavo del ocho se pelea con su vecina, o que poderia identificar uma nova figura em cena — Chiquinha e Dona Clotilde já eram conhecidas e poderiam ter sido mencionadas nominalmente.
Por fim, entraria Edgar Vivar como o Senhor Barriga — ou, simplesmente, o "senhor", como era referido no início. Sua aparição mais antiga registrada é em 31 de julho, em Como sujar a roupa do Quico. Antes disso, no entanto, outro ator chegou a aparecer como o dono da vila, nome que desconhecemos.
A fusão, a volta de Rubén Aguirre e a série
Em 8 de janeiro de 1973, um fato revoluciona a televisão mexicana: a TV TIM se funde com o Telesistema Mexicano, formando o que conhecemos hoje como Televisa. Com isso, Rubén Aguirre retorna ao elenco de Chespirito, passando a ser creditado nas sinopses publicadas pela Tele-Guía em 30 de janeiro. A descrição de 20 de fevereiro diz que "El Chavo del Ocho" y "La Chilindrina" reciben la visita del director de la escuela", dando margem para a hipótese de conter a primeira aparição do Professor Girafales.
Com o surgimento da nova emissora, Chespirito recebe a ordem de produzir três séries, cada uma com vinte minutos: Chaves, exibido às segundas-feiras; Chapolin, às quartas; e El Ciudadano Gómez, às sextas. A estreia do programa da vila foi em 26 de fevereiro de 1973, conforme noticiou o jornal mexicano "Avance", no dia anterior:
Dentro da nova programação que o canal 8 e suas afiliadas no país oferecerão a seus telespectadores a partir de segunda (26), encontra-se a série "Chaves", que começará a ser transmitida nesta segunda às oito e meia da noite, a cores e dentro da série "Chespirito".
"Chaves", um personagem criado e interpretado por Roberto Gómez Bolaños, "Chespirito", agradou boa parte do público pela ingenuidade, simplicidade e sinceridade dos seus pensamentos.
"O Chaves do Oito", segundo relata o próprio "Chespirito", é um personagem que o público pediu para que tivesse um programa próprio. Haverá também outro quadro cômico a cada semana, que irá variando.
Nesta nova transmissão, aparecem nos papéis principais: "Chespirito", Ma. Antonieta de las Nieves, Ramón Valdés, Carlos Villagrán "El Pirolo", Florinda Meza, Rubén Aguirre e Édgar Vivar. A direção de câmeras fica a cargo de Enrique Segoviano.
A estreia foi com Balões, tendo como extra o quadro Boas festas, protagonizado pelos ladrões Chómpiras e Peterete. E, curiosamente, o debut de Chaves acontece com uma história envolvendo balões, fato que se repetiria em 2006, com a série animada do Chaves, e já remetia à vez do vendedor de balões no outro programa.
O mês de março de 1972
Mas, afinal, que dia exatamente Chaves fez sua primeira aparição? Não temos a data específica, mas três fatos apontam para o mês de março de 1972.
Em março de 1974, a edição 256 da revista TV Mexicana publica uma reportagem sobre a comemoração dos dois anos do Chaves, que contou com a participação de Chespirito, Florinda Meza, Carlos Villagrán, Edgar Vivar, Angelines Fernández, Horacio Gómez e a produtora Carmen Ochoa. Diz a matéria:
Chaves cumpriu dois anos, mas não de idade, senão de estar semana a semana nos lares mexicanos que abrem suas portas ao tão simpático personagem. A direção de produção da Televisa ofereceu um animado coquetel para celebrar este acontecimento. Foi realizado no Salão Chapultepec do Hotel Aristos no 19 de março passado.
Em 1995, Roberto publica o livro O Diário do Chaves, lançado em 2006 no Brasil. A obra conta com um capítulo de Florinda Meza sobre a popularidade do personagem — e a seguinte passagem:
Tudo começou num dia de março de 1972, quando o escritor e ator mexicano Roberto Gómez Bolaños (mais conhecido por "Chespirito") apresentou na televisão o primeiro programa do seriado que comoveria um continente inteiro e boa parte do resto do mundo.
Por fim, em 2003, o próprio Roberto Gómez Bolaños cita o mês numa entrevista ao jornalista David Estrada:
O Chapolin nasceu primeiro, mas não sei exatamente a data [...] Chapolin começa em 1970 e o Chaves nasce em 1972, por volta de março. Ou seja, um ano e três meses depois do Chapolin. [...] A grande diferença é que com o Chapolin tudo foi muito bem planejado. Tudo estava "friamente calculado", melhor dizendo [risos]. E o Chaves não, o Chaves foi improvisado e começou a crescer com uma velocidade e um tamanho que eu nunca imaginaria.
Considerando que o último programa com Rubén Aguirre foi ao ar em 20 de abril e a estreia deste no canal 2 acontecesse em maio, mesmo mês em que Chaves se tornou um quadro fixo, faz sentido que o protótipo do personagem tenha estreado em março, semanas antes de sua aparição definitiva, como relatado por Chespirito em sua autobiografia.
A lenda de 20 de junho
Embora todas as evidências anteriores apontem o erro, o dia 20 de junho de 1971 segue sendo a data "oficial" da estreia do Chaves, o que foi consagrado pela Televisa e Grupo Chespirito ao longo do tempo. Hoje, o copyright do personagem leva o ano de 1971 e até mesmo o Google dedicou um Doodle à série em 2016, na celebração dos "45 anos de Chaves".
Em entrevista ao perfil @MundoChespiritoRGB no Instagram, Roberto Gómez Fernández disse que não há a certeza absoluta, mas toda a informação que conseguimos levantar é que [Chaves] é de junho de 1971. A Bruxa do 71 é por isso também. Ele confirmou que ainda possui roteiros daquela época — porém, não foram apresentados os documentos que corroborem tal data.
Já as evidências que indicam o mês de março de 1972 são fartas, como mostra este especial. Os dados foram colhidos ao longo de anos pelos fãs, que recuperaram revistas, informações em arquivos históricos de jornais e entrevistas — além de manifestações dos próprios atores.
É importante não ignorar que, mais recentemente, surgiu uma imagem de divulgação de Chespirito com Chaves e Chapolin que, supostamente, teria sido publicada no jornal "El Universal", em 19 de junho de 1971. O anúncio indica uma exibição para o mesmo dia, às 20h. Porém, nessa época, o programa era transmitido às quintas, às 21h, e 19/06 foi um sábado. Além disso, o perfil @DeMemoria, no Twitter, publicou a imagem com outra data, de 19 de junho de 1972, quando Chespirito realmente foi ao ar, naquele dia e horário, com o quadro El Chavo del ocho, se pelea con su vecina. Portanto, se outrora isso era uma prova para a tese de "1971", agora já não é mais.
Conclusão
Não é nossa intenção diminuir a importância dos 50 anos de Chaves. Pelo contrário, queremos celebrar o personagem e toda sua história de alegria ao longo dessas cinco décadas. Contudo, seria mais adequado que tais comemorações ocorressem na data correta e não em um dia que, como longamente exposto aqui, não se sustenta nas evidências.
Infelizmente, muito do que conhecemos da história de Chespirito dependeu dos próprios fãs para ser contada. A ordem cronológica dos episódios, por exemplo, só foi determinada graças à pesquisa extensa de dezenas de pessoas, vasculhando revistas e arquivos de jornais. Inúmeros episódios perdidos são conhecidos hoje, mas permanecem longe das telas — enquanto a Televisa possui material em ótima qualidade em seu acervo, visto brevemente em momentos como num esquete de "Los Chifladitos" publicado num site de DVDs do México, e trechos exibidos no especial do Biography Channel sobre Gómez Bolaños, em 2011.
Enquanto isso, seguimos em busca de dados que comprovem a real estreia do Chaves — para se ter uma ideia, somente em 2020 foi descoberto o dia exato em que o Chapolin Colorado fez sua primeira aparição, em Os supergenios de la mesa cuadrada, de 1970. Que em março de 1972, quando o Chaves deverá completar, de fato, seu cinquentenário, esperamos que esse mistério tenha sido solucionado.
Texto e pesquisa: Igor Borges
Edição e revisão: Antonio Felipe
