Farsa
Papa faz demagogia com as mulheres enquanto Igreja condena o aborto
A nomeação de uma mulher para o alto escalão do Vaticano não sinaliza nenhuma mudança na posição da igreja quanto à libertação da mulher das amarras sociais que as escravizam.
O papa Francisco anunciou, na última semana, a nomeação, pela primeira vez, de uma mulher para um cargo de alto nível no Vaticano. Francesca Di Giovanni, 66 anos, natural de Palermo, trabalha há 27 anos na Secretaria de Estado do Vaticano e assumirá a função de vice-ministra da Secretaria de Estado da Santa Sé, órgão similar ao governo central do estado.
Di Giovanni ocupava até agora o cargo de subsecretária encarregada do multilateralismo na seção de Relações com Estados, o que equivaleria ao ministério de Relações exteriores, adquirindo experiência nas questões de direito internacional humanitário e questões relacionadas à imigração e refugiados.
Desde 2013, o líder da igreja Católica vem destacando em seus pronunciamentos a importância da valorização das mulheres na sociedade em geral, denunciando as injustiças de que são vítimas e sinalizando para a possibilidade da ocupação de cargos na igreja. Em entrevista ao portal Vaticans News, a nova vice-ministra reconhece que o papa tomou “uma decisão inovadora, que representa um sinal de atenção com as mulheres e que vai além da minha pessoa”.
De fato, decisão inovadora em se tratando de uma instituição de conservadorismo milenar, porém devemos lembrar que apesar de se pronunciar sobre as injustiças das quais as mulheres são vítimas, a igreja representada na figura do papa, não faz menção alguma sobre uma grande injustiça e instrumento de opressão social que as mulheres sofrem que é a equiparação do aborto à crime.
Não entraremos nas questões morais e religiosas envolvidas no que diz respeito ao aborto, como também não poderemos esperar que uma instituição religiosa não faça críticas ou condene o ato tendo em vista seus valores e crenças. Porém precisamos falar do significado da posição da igreja ao não se pronunciar sobre a criminalização da prática e a omissão sobre as consequências disto para a sociedade inclusive no que se refere às questões de saúde pública.
No Brasil, como em outros países, o aborto induzido é considerado crime previsto pelo Código Penal desde 1984 , com penas que variam de um a três anos tanto para a gestante quanto para quem executa o processo. No caso de aborto sem o consentimento da mãe as penas podem chegar à 10 anos de reclusão.
O aborto somente não é equiparado a crime nos casos de estupro, ou quando houver risco à vida da gestante ou quando for constatado anencefalia do feto. Nestas situações a lei permite a prática desde que haja um processo judicial e decisão que o libere. Conhecedores que somos da morosidade da justiça quando os assuntos não são do interesse da burguesia, o aborto geralmente ocorre de forma ilegal e em condições sanitárias insalubres.
A prática clandestina do aborto leva à milhares de mortes ou sequelas irreversíveis no mundo todo. Estima-se que 44 milhões de abortos sejam realizados por ano e que 70 mil mulheres morram em consequência disto na totalidade dos países. No Brasil o aborto clandestino é a quinta maior causa de morte materna. Para a rede pública de saúde, o ônus da prática é muito grande, tratando-se de um grave problema de saúde pública, pois as internações por interrupção de gravidez superam as internações por câncer feminino.
Embora o líder católico já tenha anteriormente se pronunciado sobre a questão do “perdão” às mulheres que praticam o aborto, é necessária uma posição clara e firme em relação a descriminalização por parte da igreja, tendo em vista sua influência na sociedade. Diante do flagelo feminino, a valorização da mulher tão falada pelo pontífice e exaltada na nomeação de Francesca para o cargo até então delegado somente à pessoas do sexo masculino, torna-se apenas mais um ato demagógico, pois não muda absolutamente nada para as milhares de mulheres que sofrem as sequelas da condenação moral, ou em própria saúde da prática do aborto , como também a incapacidade de gerir sua vida em decorrência de uma gravidez indesejada. Descriminalizar o aborto é possibilitar que as pessoas sejam donas de seus destinos e possam fazer suas escolhas independente dos valores morais e religiosos, libertando-as das amarras que as controlam, direcionam e as oprimem na sociedade burguesa.
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