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Com as chuvas dos últimos dias, o governo adiou para o fim de março a decisão sobre o rodízio de água em São Paulo. Anunciou, também, ter encontrado um quarto volume morto na Cantareira.
Mas isso não significa que a crise da água tenha passado. Ela deixa problemas antigos ainda mais evidentes, como os
vazamentos de água. E nem sempre eles são visíveis. É preciso caçá-los.
A procura não é só pela água desperdiçada, mas também pelos espertalhões que tentam tirar vantagem até mesmo num momento delicado como esse.
Às 10h de quinta-feira (12),
policiais e funcionários da Sabesp, a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo, estão à procura de gente que furta água e logo encontram.
Eles já conseguiram identificar a fraude. Viram que a água estava vindo de uma mangueira. Ela estava ligada diretamente a tubulação da Sabesp na rua. Sem o hidrômetro, o aparelho que mede o consumo, não tem como a empresa cobrar pela água do prédio.
Uma mulher foi identificada como a responsável pelo edifício.
Investigador: Por ora, você está presa em flagrante. Foi constatado fraude de água, furto de água e você é responsável por isso.
Mulher: Não, eu não sou responsável. Eu recebo os aluguéis da dona.
Investigador: Então, lá na delegacia, você vai provar, tá bom?
Ela pode responder por furto.
“É crime punível, é o artigo de
furto de água com punição de até
quatro anos de prisão”, explica o delegado Reinaldo Vicente Castello.
Na mesma operação, também foram constatadas outras duas fraudes. A maior delas, em uma galeria no Centro de São Paulo, com 300 apartamentos residenciais, 180 escritórios e 200 lojas.
O Fantástico entrou no subsolo dessa galeria para ver o que que eles encontraram lá de irregularidades. Está bem atrás de uma parede. E bem no meio da tubulação tem um desvio. Com o desvio, parte da água vai direto da rua, sem passar pelo relógio. É aí que está a fraude. Foi uma surpresa para o pessoal que mora e trabalha no local.
“Todo mundo está economizando água. É para ficar revoltado e tudo”, diz uma mulher.
A síndica e o advogado da galeria alegaram que não sabiam de nada.
“Nunca vi isso. Primeira vez na minha vida. A conta só sobe. Nunca baixou a conta”, afirma o advogado Airson Carlos do Nascimento.
Mas o Fantástico teve acesso ao consumo. Quando mostrado pra eles...
Fantástico: Em maio de 2014 vocês estavam gastando 1.184 metros cúbicos. Agora, em janeiro de 2015 caiu para 599. Metade, né?
Maria Lúcia Borges Pereira, síndica: Em junho desse mês você fala?
Fantástico: Em 2014, vocês estavam gastando praticamente o dobro do que vocês gastam agora.
Maria Lúcia Borges Pereira: A gente tem, a gente tem diminuído realmente. A gente tem feito muitas coisas.
Os dois também foram levados à delegacia. Em 2015, já foram abertos 25 novos inquéritos desse tipo de crime. Quarenta e seis pessoas estão sendo investigadas e monitoradas por suspeita de fraude.
José de Godoy Pereira Neto, delegado: São ex-funcionários da Sabesp, boa parte. Então eles têm conhecimento de como funciona, quem é o comércio mais interessado: postos de gasolina, restaurantes, bares, hotéis.
Fantástico: Mas são
quadrilhas mesmo
que estão agindo nesse tipo de situação, nesse tipo de
irregularidade?
José de Godoy Pereira Neto: Sobre o aspecto dos fraudadores, acredito que sim, que haja uma organização. Agora, o beneficiário, ele está lá e recebe a oferta e, de má fé, adere a essa fraude. Responderão pelo mesmo crime.
A Sabesp diz que perde quase 10,5% da água tratada por causa das fraudes.
Pior do que isso são os
vazamentos :
19,5%. Perda total: 30%.
É muito, segundo o presidente do Instituto Trata Brasil, uma organização que luta contra o desperdício de água.
“É como se você perdesse 30 pãezinhos de 100 que você produzisse.
Essa água já está potável, já foi tratada, já se consumiu produto químico,
está pronta para se distribuir, e se perde. É um absurdo”, destaca Édison Carlos, presidente executivo do Instituto Trata Brasil.
Só nos vazamentos, foram desperdiçados mais de 26 bilhões de litros de água em 2014. Daria para abastecer uma média de 1,4 milhão de famílias de quatro pessoas durante um mês.
Na companhia de saneamento, centrais monitoram os vazamentos. Eles colocam sempre, em cada pontinho da tela, a indicação de que há um vazamento. Por dia são três mil ocorrências.
Fantástico:
Quais são os motivos dos vazamentos ?
Roberval Tavares de Souza, superintendente da Sabesp:
Concessionárias de gás, concessionárias de energia, que quebram a nossa rede. Ou pela vida útil da tubulação, que pode estar com o seu prazo de vencimento muito próximo.
Quando se fala nesse assunto, a gente logo pensa em água jorrando para todo lado. Mas há muito desperdício que os olhos não veem. Na Região Metropolitana de São Paulo, são mais de 35 mil quilômetros de canos subterrâneos conectados a 4,6 milhões de ramais que levam água potável para os clientes. Os vazamentos podem estar em qualquer ponto dessa rede.
“Às vezes, ele acontece por décadas. Enquanto o solo não colapsar, enquanto o solo não afundar naquele lugar por causa da constante umidade, ninguém vai saber que aquele vazamento existe”, explica Édison Carlos.
Tem que caçar o vazamento. E como? A água faz barulho. Tem que ouvir com atenção. O equipamento mostrado no vídeo é chamado de haste de escuta. É bem parecido com aquele aparelho que o médico usa para ouvir o coração, o estetoscópio. O funcionário coloca a haste perto da tubulação, perto do hidrômetro. O funcionário fecha o registro para a água não passar. Se mesmo assim ele ouvir um ruído, pode ser vazamento.
Para ter certeza do ruído, se há mesmo ou não, vai um outro técnico, que coloca um outro aparelho que vai amplificar o ruído. O vídeo acima mostra quanta água está saindo do cano que leva a água até o hidrômetro. Ele estava rachado. É uma tubulação um pouco mais antiga, e que por isso é que a água estava vazando. Uma rachadura quase que invisível.
O vazamento foi bem em frente a um salão de cabeleireiro.
Fantástico: É perder uma água preciosa, não é?
Daniele Souza, gerente do salão de cabeleireiro: Com certeza. Na escassez que está.
Parte da tubulação danificada foi substituída. A Sabesp diz que a meta é trocar 670 quilômetros de rede e 840 mil ramais até 2017.
“É muito pouco. Então, esse esforço precisa ser muito maior, porque a rede vai se degradar até 2017. Isso tem que ser feito uma troca da rede quase toda. Hoje, a gente colhe o fruto dessa política errada, de pouca manutenção nas redes”, afirma Édison Carlos.
Ele diz que investir na manutenção é fundamental para reduzir a quantidade de água perdida.
“Quinze por cento é um número adequado. Ainda é maior do que países como Japão, Alemanha, que estão muito mais à frente. Mas já é metade do que se perde hoje”, avalia o presidente do Instituto Trata Brasil.
“Nos últimos oito anos, nós investimos mais de R$ 6 bilhões diretamente no programa de redução de perdas aqui na Sabesp”, afirma Roberval Tavares Souza.
“A gente viveu com a ilusão de que tinha muita água. Hoje está provado que não tinha. Portanto, temos que rever, planejar, porque senão a tendência é que a gente fique sem água por muito mais tempo”, avalia Édison Carlos.